"Finalmente, na segunda-feira de Pascoela, já à noitinha, o nevoeiro dissipou-se, as nuvens diluíram-se em flocos brancos e o bom tempo chegou finalmente. No dia seguinte pela manhã, um sol resplandecente acabou de derreter a fina camada de gelo que se formara durante a noite e o ar morno impregnou-se dos vapores que subiam da terra. A erva velha ganhou imediatamente tons verdes, a erva nova despontou no solo, os rebentos dos viburnos, das groselheiras, das bétulas encheram-se de seiva e sobre os ramos dos vimes, banhados em luz dourada, as abelhas, abandonando os seus quartéis de inverno, zumbiram alegremente. Invisíveis cotovias soltaram o seu canto por cima do veludo dos prados e das choupanas cobertas de gelo, os fradezinhos gemeram nas concavidades e nos pântanos submersos pelas chuvas torrenciais. Os grous e os gansos bravos vararam o céu com os seus guinchos primaveris. As vacas, cujo pelo irregular apresentava, aqui e ali, grandes peladas, mugiram nos pastos. Em volta das ovelhas balantes que começavam a perder o pêlo, os cabritos saltitavam, canhestros. Ao longo dos atalhos úmidos corriam os garotos, que deixavam no chão o desenho dos seus pés nus. Em torno dos tanques ouvia-se a algaraviada das mulheres dos mujiques reparando sebes e arados. A primavera chegara realmente." (Anna Kerenina - Leon Tolstoi)
Foto de Ana Labarrère